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sábado, 22 de maio de 2010

As you leave, please, would you just close the door?

O tempo foi passando e ele ia percebendo as mudanças. As mudanças essas, de fora eram muito poucas e se faziam perceptíveis em uma velocidade lenta, como é normal de se esperar do curso do mundo e da realidade. Porém, o interior de si passava a revolver-se e criar muitas camadas. Nem mais essencialmente ele se enxergava o mesmo, e isso o confundia muito. Os contornos tornaram-se linhas borradas, algumas dessas desapareciam a cada dia e outras eram desenhadas em lugares completamente distintos. É um jovem adulto esse rapaz; um amigo disse a ele em certa ocasião: "não seremos adolescentes eternamente" e agora percebe a coerência da afirmação. Pois é... Ele ia percebendo que o ano de seu nascimento estava cada vez mais distante se tentasse localizá-lo em sua ínfima linha de tempo, aquela que traçava para si, com muitas setas apontando para eventos futuros. Tinha a sensação de estar aprendendo os mistérios, aqueles falados ao pé do ouvido em sussurros. Aprendendo a pegar o vento com as mãos, a fazer-se de água e de pedra quando visse a necessidade.
Quanto mais passava o tempo e mais passavam os momentos que ele considerara memoráveis, mais ele via muitas cascas sendo deixadas para trás. A pele jovem conformava-se com o que os olhos iam vendo, com o que a cabeça ia percebendo. Não era mais tão inocente, calado e sonhador, pois os pés estavam se assentando ao chão e aos limites. Limites esses sendo delineados em uma caminhada solitária e de certa forma, salgada. Peço perdão pela metáfora culinária, mas aqui ela cabe de maneira adequada. O sofrimento e a solidão salgam-no. Não que ele seja um pobre diabo, um abandonado ás mordaças da indignidade e da subexistência. Tinha todas as condições para seu desenvolvimento, para suas experimentações. Sem dramas aqui. É apenas a descoberta de um certo indivíduo sobre sua condição nova e mutativa. Conforme as cascas iam caindo e sendo deixadas pelo caminho, ele ia tendo dúvidas para se reconhecer e se delimitar do resto de tudo, olhava para si mesmo e pensava no amanhã. "Será que estarei tão diferente quão diferente hoje me sinto em relação ao ontem?" Era um questionamento constante. Havia se tornado frequente ele olhar para o "eu" de hoje e pedir para que ao sair, fechasse a porta, mas não... O "eu" sempre a deixava aberta para o próximo.

terça-feira, 18 de maio de 2010

"Escrever é libertador"

Não quero que este blog vire um e-book de auto ajuda. Jamais escreveria algo com essa proposição, pois não faz parte do meu feitio. Só que, embora eu não adote o perfil literário, me percebo escrevendo e dando sentido ao que apazigua meus pensamentos. Todas as cadeias de pensamentos que trazem consigo o caos de uma guerra interior são colocadas em uma caixa de texto e depois eu pressiono o botão "publicar postagem". Simples assim. É o que vem acontecendo com a minha "produção literária" há muito tempo, talvez por serem esses pensamentos (muitas vezes, legítima tortura mental by myself) a demanda principal e mais urgente. É válido, claro, atender ao chamado da própria cabeça e consolar-se escrevendo o que foi exorcizado de dentro de si, "é libertador" como diria um conhecido meu. Escrita como exercício de apaziguamento da psiquê. Porém, o que se faz quando é percebido que a escrita como exercício psicológico é a unica produção? Fica tudo esquematizado: sente dor, pensamentos ruins incomodam e causam desconforto, senta e escreve passando muitos minutos em um transe que proporciona a descrição exata da dor, como se te tornasse por esses momentos a criatura mais apta a descrever o mundo de dentro. Só que, por mais que esse mundo pertença ao interior de si mesma, a criatura consegue descrevê-lo sem distorcer pelas sensações daquele momento? O que está dentro dificilmente sai puro e condizente se for descrito e visualizado quando se está num momento de muita dor ou euforia; tudo se torna da mesma cor. Além do mais, nesses momentos de transe e de exorcismo, o que sai é escasso e fragmentado.
Tá, tudo isso pra dizer: é ótimo escrever pra se libertar, mas esse ato pode acabar provocando vícios e distorções na expressão literária.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Fantasia

Ok, vamos passar a desconsiderar tudo. Além da matéria, das características fisico-químicas, o resto é pura fantasia. As memórias evocadas, as sensações, emoções provocadas são como os sonhos durante o sono. A transformação da realidade em algo significativo ocorre quando subjetivamos os fatos? Quando ajuntamos a estes, valores, emoções, sentidos? A realidade em si vai se diminuindo cada vez mais, vai cedendo terreno às impressões afixadas por nós. De dentro vem o princípio para uma realidade valorada, impregnada do status de condição humana. O chão é só o chão e o resto é fantasia. Acreditar que além do espectro do "interno" projetado nos poucos aspectos do "externo" torna tudo mais pobre, mais vago. Não vale a pena tentar construir algo sobre um amontoado de nada, revestido por milhões de fantasias e pensamentos. Criar perverte-se em sobrepor camadas de sonho em cima de algo distanciadamente real. Será? Acho que não. O diálogo toca as realidades e as fantasias, a invenção toda do interior de cada um, e cada pedaço de matéria. A interação faz reagir dentro de cada um o acréscimo de vida, de transformação. É como se a realidade absorvesse a fantasia para conceber realidade, como se a neblina de fantasia que cobre tudo e todos se afastasse por um momento. É a interação que nos tira do egocentrismo da introversão.

domingo, 16 de maio de 2010

Together we won't dance in the dark.


Há uma solidão intrínseca aos homens. Ela os corrói sem lhes dar chances de descansar em paz. Os persegue além da morte e os consome aquém do túmulo. Quando percebem a existência dessa solidão, recebem uma tocha para que seu caminho seja precariamente iluminado pela chama do objeto. E essa chama vai se extinguindo, até devolver o homem ao ponto de início: a escuridão total. O homem caminha e escuta o eco de seus passos; mesmo sem saber onde estão os muros, onde estão os limites, eles existem. Eles existem para fazer com que o caminho seja cheio de expectativas, será que o fim é este? Não ouço mais o eco, e agora? Meus passos não me levam a nenhum lugar novo. Não há como saber se se está caminhando em linha reta, para frente ou para trás, em círculos. E pior, não há como saber se o movimento de fato acontece. Os olhos procuram a luz e ela os abandona quando a tocha se apaga. Ninguém quer devolver a tocha, mesmo que ela vá durar por pouco tempo dentro da jornada; uns tentam achar outros. Eu quero te achar no meio disso tudo e tu queres me achar, mas não nos vemos, não nos sentimos e o eco continua, perpétuo, dando a certeza de que o ambiente está vazio exceto pelo homem que caminha. Os pensamentos fazem muito barulho, eles deveriam iluminar tudo e fazer com que tudo ficasse agitado, mas não, nada muda. Os pensamentos ecoam por dentro, nada diferente do que ocorre fora do corpo, no caminho escuro e solitário. A tocha se apaga, a escuridão se acende. Um dia eu encontro o muro, eu vou encontrar algo em que eu possa me escorar, não é mesmo?

Por momentos as estrelas podem ser vistas, e nesses momentos se percebe: onde está o teto? Não há nenhum teto. Elas não estão no teto, elas estão... longe, e só. Há um caminho e há paredes em algum lugar por aí, mas teto, não, teto não existe. Vamos embora? Vamos?! Não há “nós” aqui, só “eu”, e “tu” distante como uma estrela longe do caminho. Nem no teto ela está!!! Nem no teto tu estás. Vultos podem ser vistos, mas não tocados. Os vultos não geram eco, eles provavelmente nem por perto estão. Não se deve criar ilusões a respeito desse caminho, ele deve ficar sendo apenas um caminho. Tropeços são comuns, já que está tudo escuro por aqui... E como as tochas se extinguem rapidamente, as mudanças do relevo são imperceptíveis. Quando se chega em algo que possa ser uma parede, aí o que acontece é estranho: sim, eu queria limites, mas agora penso melhor e essas paredes me limitam, me sufocam, não quero que acabe aqui. Para que acabar com a caminhada, se os meus olhos podem enxergar mais longe, e se eu tiver a tocha novamente? Foge-se das paredes e rapidamente o fogo da tocha acaba. O que isso significa? A luz que traz esse objeto é falsa, pois ela só funciona quando nos prendemos às paredes sólidas, que podem prender até nossos pensamentos. Quando nos afastamos das paredes, dos limites, a escuridão ressurge, a dúvida ressurge. E continuamos errantes, vagando e pretensiosamente acreditando que o fim do caminho chegará. Cada vez multiplica em muitas vezes a escuridão. Transtorna o interior e distorce as percepções e certezas sobre o caminho. O homem tenta correr, tenta rastejar e pode ser que essas duas movimentações tenham valor idêntico nesse percurso tão singular. Um passo e depois o outro, e o outro, todos podem ser o mesmo passo para o nada. O suor e o cansaço renovam as expectativas... Estou cansado, então devo estar chegando, devo estar no caminho certo, fazendo o percurso certo. Creio que não... Mais pessoas estariam perto de ti se estivesses percorrendo o caminho certo: estarias acompanhado. E quem te acompanha? O breu e só. Breu faz parte do jargão do viajante, que viajante ridículo. Ele é claustrofóbico em alguns momentos e agorafóbico na maior parte da jornada. Ele tem medo de tudo, esse homem, ele tem medo de si, medo de não achar nunca essas paredes confortáveis, medo de querer ver as estrelas por um breve momento quando acreditar ter encontrado as tais paredes que são ideais para ele. Ele se pergunta todo o tempo: “será que eu continuo caminhando ou paro agora?”